O "PÚBLICO" E O SEU PÚBLICO- o título é meu
.........Depois das passagens meteóricas de Nicolau Santos e Sarsfield Cabral, a direcção ficou nas mãos de José Manuel Fernandes,que rapidamente transformou o lugar num posto de combate ideológico. Vindo, como tantos outros, da extrema-esquerda, assentou arraiais na direita conservadora com o mesmo empenho, militância e dogmatismo de sempre. E quis que o jornal revelasse as suas convicções. Nada de grave, isto de um director ter um posicionamento ideológico e faze-lo sentir. O lugar, pela história, origem e posicionamento do “Público”, é que era o errado.
O “Público” passou então a viver em permanente esquizofrenia. Com uma redacção de esquerda, com uma tradição de esquerda, com a maioria dos leitores de esquerda, o director fez do jornal um ponto de combate ideológico da direita. Primeiro nos seus editoriais, que passaram a ter um cunho pessoal muito mais vincado e a estarem muito mais centrados no seu director do que acontecia no tempo de Vicente Jorge Silva. Depois nos colunistas, relegando Eduardo Prado Coelho para o interior do jornal e desequilibrando lentamente, com novas entradas e algumas saídas, a opinião. Por fim, depois da guerra do Iraque e do reacender do debate político, as obsessões do director passaram finalmente a ter presença assídua na primeira página do jornal. Sobreviveu parte do interior do jornal, escrito por uma redacção que tem muito pouco a ver com o seu director. José Manuel Fernandes descaracterizou o “Público” sem, no entanto, o conseguir transformar noutra coisa. Fez dele uma manta de retalhos sem coerência nem sentido. Hoje é impossível perceber qual é a linha editorial do jornal. Conhecemos apenas a do seu director.
Mas isto muda hoje, dia 5 de Março de 2008. Ao escolher para dirigir o jornal por um dia, no 18º aniversário, o seu inspirador ideológico, mandando às urtigas toda a história do “Público”, José Manuel Fernandes faz a sua confissão: o “Público” é, para si, o mesmo que foi a “Voz do Povo” - um projecto político. Ao escolher um colunista da casa, um amigo de sempre, reduz um dos mais importantes títulos portugueses a uma coisa pequena e paroquial. O simbolismo desta escolha é evidente e é triste.
Pela mão do seu director, o “Público” passou anos a maltratar a sua alma e a desbaratar todo os seus activos. O “Público” foi representando uma farsa, fingindo continuar a ser o jornal que começámos a ler há 18 anos. Com este convite, José Manuel Fernandes esfaqueou finalmente o retrato que, como o de Dorian Gray, andava escondido dos olhos dos leitores mais desatentos. E com este acto de arrogância medíocre o director obriga o jornal a exibir finalmente a sua verdadeira natureza. Com a assinatura do político Pacheco Pereira, José Manuel Fernandes mostra com orgulho a sua obra: a transformação do melhor diário português numa trincheira ideológica contra-natura. E, mais importante, um jornal a todos os níveis muito pior do que aquele que foi fundado por Vicente Jorge Silva. Resta-nos assim o projecto pessoal de José Manuel Fernandes. O que é muito pouco, tendo em conta que a pessoa do projecto é só aprendiz de Pacheco Pereira.
Publicado por Daniel Oliveira a 5 de Março de 2008 no ARRASTÃO
Sem comentários:
Enviar um comentário