........Chega-se, assim, ao paradoxo total: a natureza
sistémica da crise serve para explicar, até por antecipação, um
eventual segundo pedido de ajuda externa mas já não serve para explicar o
primeiro! Esta tese, é claro, parece demasiado conveniente para ser
verdade. E é.
Impressiona como bastou a mudança de Governo para alterar tão
radicalmente a compreensão de tanta gente sobre a natureza da crise que
enfrentamos. Tão súbita conversão parece milagre e faz por isso lembrar o
célebre episódio bíblico da conversão de S.Paulo. Também ele, de
repente, viu a luz.
A história, narrada nos Actos dos Apóstolos, resume-se assim: S.
Paulo, então ainda simplesmente Paulo, feroz perseguidor dos fiéis,
seguia pela estrada de Damasco quando se viu subitamente envolvido por
uma intensa luz vinda do céu, a qual, ao que está escrito, o terá feito
"cair por terra". O pobre Paulo, em estado de choque - como se tivesse
levado, digamos assim, um murro no estômago - terá estado ainda três
dias sem ver e só depois compreendeu o que tinha acontecido:
converteu-se e recuperou a visão. Muitos, subitamente convertidos à dura
realidade desta crise sistémica, parecem ter passado por uma
experiência semelhante.
Durante anos, empenharam-se em negar ferozmente, em acesas batalhas
políticas, a relevância decisiva da crise internacional para explicar as
dificuldades excepcionais que o País enfrenta. Agora, de repente, viram
a luz, compreenderam tudo e passaram da cegueira à lucidez. Entretanto,
como na história de Paulo, caíram por terra.
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Pedro Silva Pereira, Jurista no Diário Económico
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