Subscrevo o que Vieira diz sobre a cu-municação sucial.
Ele queixa-se que procura um artigo de há meses sobre o poder de Balsemão, mas não o encontra. Pudera!
A súcia merdiática tem escapado sistematicamente ao escrutínio da opinião pública, salvo os resmungos da praxe.
A história da comunicação social não teve entre nós origens auspiciosas, é certo. O salazarismo foi seguido de estatização, espécie de modelo soviético em democracia, condenado à extinção.
Desde o tempo de Cavaco, o público português habituou-se por indiferença e impotência a aturar complacentemente os inúmeros aldrabões e mixordeiros que têm pululado na comunicação social. Em compensação, o público habituou-se também a estar sempre de pé atrás. As enxurradas de notícias desmentidas, as conspirações desmontadas, as campanhas com rabo de fora habituaram-no a relativizar o valor da mercadoria adulterada. Certas histórias escabrosas que milagrosamente vieram à tona (p. ex. o caso das escutas) enojaram-no e revoltaram-no. Mas de cada vez que esse mesmo público se senta em frente ao televisor ou abre as páginas de um jornal, opera-se inadvertidamente o milagre da fé renovada. O paciente distende por momentos as suas prevenções e defesas, transformando-se imperceptivelmente numa criança benévola e crédula. A inoculação acrítica da informação marada pode durar apenas uns segundos ou minutos, mas deixa resíduos tóxicos.
O grande tema-tabu da comunicação social é, desde Cavaco, a própria comunicação social. Como se formaram os grupos que conquistaram e dominam totalitariamente o espaço mediático português, com que meios financeiros, com que privilégios e cumplicidades políticas? Num país onde se sabe tudo sobre os cornos, os implantes mamários ou a cor das cuecas de certas celebridades e figuras públicas seleccionadas, onde está a história da Impresa, da Lusomundo, da Controlinveste, da Cofina, da Media Capital, da Sonaecom? Quem são, que interesses têm, quem representam? Que lucros ou perdas têm? Quanto devem à banca? Que relações inconfessadas e simpatias políticas têm os sete indivíduos que monopolizam a indústria da informação? Recuando no tempo, como e por quem foram atribuídas as frequências nacionais de rádio e televisão a entidades privadas? Que objectivos perseguia, que apoios políticos teve e quanto perdeu a Igreja na sua desastrada aventura de televisão? Como passou a TVI da Igreja para a Sonae e desta para a Media Capital? Porque se opuseram histericamente Cavaco, Ferreira Leite e Balsemão (entre outros) a que a PT entrasse na Media Capital? Quais as perdas acumuladas pela Sonae com o jornal Público desde o ano em que foi lançado? Como foram privatizadas as empresas públicas de comunicação social? Que políticas de serviço público de comunicação social foram seguidas pelos diferentes governos? Que relações secretas existem entre a comunicação social e as polícias, o ministério público e os juízes? Como tem sido o trânsito de “profissionais” da comunicação social entre esta e a assessoria política, nos dois sentidos?
Em particular, o patrão da Impresa, fundador e há muito o militante número 1 do psd, ex-presidente do partido e ex-pm, nunca foi alvo de um estudo exaustivo e sério sobre o império de media que construiu e sobre o poder que tem na sociedade e na política portuguesas. A RTP, por exemplo, nunca encomendaria tal estudo, para não ser acusada – vade retro satanás – de ataque à iniciativa privada e à liberdade de informação. Nenhum jornalista de nenhum jornal, revista, rádio ou televisão se aventuraria por tal caminho investigativo, porque mais tarde ou mais cedo sofreria represálias na sua carreira.
Os jornalistas realmente independentes, já nem falo dos comentadores, contam-se pelos dedos das mãos. Não há em Portugal um jornal ou um semanário de qualidade digno do título de “independente” – rótulo aliás queimado desde que um periódico com esse nome esteve descaradamente ao serviço das ambições políticas pessoais de Portas, conduzindo sistemáticas campanhas de ataque pessoal aos seus concorrentes e inimigos (que eram muitos, valha-nos ao menos isso).
O panorama da comunicação social portuguesa resume-se nisto: oligopólio, promiscuidade económico-política, manipulação sistemática, cobardia e impudor jornalísticos, impotência do público. Nos últimos trinta e tal anos só houve um progresso, mas veio de outro mundo, chamado internet, e das suas filhas blogosfera e redes sociais. Sem isto, ainda estávamos na fossa.
Oferta do nosso amigo Júlio
DO BLOG ASPIRINA B
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