segunda-feira, abril 27, 2015

LARANJADA!

Verdade com sabor a laranja

Já em 2009, às portas das eleições mas com o País em pré-bancarrota, o PS de Sócrates usara da mesma estratégia. Aumentou os salários na função pública e reduziu a taxa normal do IVA e, pelo caminho, prometeu TGV's e cheques bébé.
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Tendo convocado Yourcenar para um exercício que se esgota em tratar os socialistas como mentirosos, esta deputada do PSD introduz um acrescento refrescante na cassete da “bancarrota”: em Setembro de 2009 já estávamos em “pré-bancarrota”. Porquê? Não terá tido tempo, ou caracteres, para explicar. Aliás, talvez convenha nada explicar para não tirar encanto literário à imagem. O talento romanesco não carece do zelo e aridez da racionalidade demonstrável.
Acontece que o conceito “pré-bancarrota” é de irresistível utilidade. Pode ser aplicado sem limite lógico por ser desvairadamente plástico. Podemos até perguntar se haverá algum período na História onde os Governos, nacionais e internacionais, não tenham estado em “pré-bancarrota”; exclusão para os que, de facto, entraram em bancarrota e só durante essa altura. Por aqui, a Francisca está a representar com garbo a “política de verdade”, outro conceito que conhece muito bem posto ter sido eleita para o Parlamento sob a sua égide. A chatice começa quando nos recordamos do que não ouvimos nem lemos nesses idos de 2009. E não ouvimos nem lemos ninguém do PSD ou CDS a falar em bancarrota, pré-bancarrota ou ante-quase-pré-bancarrota. Do que se falava era das contas que as “gerações futuras” teriam de pagar por causa de umas estradas algures. E também se falava muito da “asfixia democrática”, do “Freeport”, “da PT e da TVI”, da “Manuela Moura Guedes”, do “clima de medo” e de uma malandragem que andava a espiar o correio electrónico do Sr. Cavaco. Pode dar-se o caso de essa asfixia ter reduzido drasticamente o oxigénio a circular pela mioleira dos estrategas da direita ao tempo, eventual razão pela qual deixaram escapar o tema da franciscana “pré-bancarrota”. Enfim, um dia o Pacheco revelará em livro o que realmente se passou.
A “bancarrota” está connosco desde meados de 2011 e não tem tido um dia de descanso. A campanha eleitoral da direita não terá muito mais para berrar do que esse estribilho. Se tudo se mantiver igual, e vai manter, não teremos direito a qualquer explicação acerca do que causou a tal festejada “bancarrota”. Terá sido causada pelo TGV que não chegou a ser construído e para o qual havia fundos comunitários, sendo que o projecto tinha nascido num Governo PSD onde contemplava 4 linhas? Terá sido causada pelo novo aeroporto que não chegou a ser construído? Terá sido causada pelas PPP cujos custos só iriam ser pagos pelas gerações futuras? Terá a “bancarrota” nascido do gasto em combustível de avião para carregar os computadores Magalhães daqui para fora? Terá a “bancarrota” aparecido como consequência do investimento em energias renováveis e consequente diminuição das importações de petróleo que originaram? Será que a “bancarrota” foi o resultado inevitável da instauração do Simplex? A lista é fastidiosa, pelo que nos daria muito jeito ter os arautos da “bancarrota” a fazerem uma pausa no estado de êxtase com que celebram a chegada da mesma e dignarem-se apresentar alguns dados carnudos para mastigarmos.
Claro que o problema se torna ainda mais bicudo quando olhamos para o que literalmente se passava em 2011 até à “bancarrota”. Tendo o Governo socialista apresentado um plano que continuava e alargava as políticas iniciadas em 2010, por imposição europeia, para diminuir as despesas do Estado, vimos a direita a chumbá-lo e a levar o País para uma crise política que de imediato o afundou nos mercados de financiamento, acabando por obrigar ao resgate em poucas semanas. Até parecia que a direita não queria mais medidas de austeridade e que assim anunciava aos portugueses e ao Mundo que vinha aí o fim dos sacrifícios.
Não sei se a Francisca Almeida se lembra desta história. Não sei se tem uma memória de Adriano. Mas lá que ela e o tempo são dois grandes escultores, isso fica patente na extraordinária capacidade para moldar o passado segundo o seu gosto e fantasias. Fantasias verdadeiras, obviamente, e com sabor a laranja.

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