No seu romance “Grandes Esperanças”, Charles Dickens, um dos escritores que melhor retratou o século XIX, apresentava assim o mundo vertiginoso que estava então a surgir: “Perguntei-lhe qual era a sua profissão. ‘Capitalista’, respondeu-me. Suponho que me viu percorrer a sala com o olhar, porque prosseguiu: ‘Na City. Não me vou contentar em empregar os meus capitais a segurar navios. Vou comprar ações numa boa empresa e conseguir um lugar no conselho de administração. Vou também ocupar-me um pouco de negócios mineiros. E nada disto me impedirá de fretar alguns milhares de toneladas para mim próprio. Creio que farei negócios com as Índias’. E os lucros serão importantes?, perguntei. ‘Assombrosos’, respondeu.”
Dizia Pires de Lima aos dois candidatos a comprar a TAP: vamos a não se contentarem em empregar os capitais em aviões. É preciso ir mais além. Os lucros serão assombrosos.
Parece que o Estado está disposto a ficar com parte da dívida (ou toda?), em troco de trinta milhões. Assombroso.
No que ao PIB diz respeito, em 2010, antes do Governo PSD-CDS a economia portuguesa crescia 1,9 por cento, embora impulsionada por uma despesa pública que acabaria, é bom que se diga, por pressionar quer o défice orçamental, quer o endividamento do país. Mas repare-se as medidas de autoridade impostas entre 2011 a 2013, fizeram com que o PIB recuasse um total de 7,3 por cento, quando era expectável que fosse somente 3 %. Foi o dobro!
Quanto ao défice, Portugal passou de 11,2 por cento do PIB em 2010, a cifra mais elevada desde 1995, para 4,5 por cento em 2014. Foi para isto que se impôs esta catástrofe ao País? E os dados encontram-se disponíveis: o desemprego saltou dos 10,8 % de 2010 para os 16,2 por cento de 2013; sendo que nas camadas mais jovens da população ativa é atualmente superior a 34 % , e em 2013 a taxa era de 38%.
Como se toda esta autêntica catástrofe social não bastasse, assistiu-se a uma venda ao desbarato, para todos os efeitos em saldo, de empresas públicas estratégicas para a comunidade portuguesa. E socorrendo do jornalista Nicolau Santos, uma fonte a não descurar, pela objetividade, os exemplos estão aí bem patentes: a EDP foi vendida aos chineses, mas podem subir sempre o valor das rendas aos clientes, para não descer de um determinado nível de lucro; a ANA a aeroportos foi vendida aos franceses, mas sempre que o tráfego aéreo aumentar poderão aumentar o valor das rendas a cobrar; os Correios foram vendidos a um fundo de pensões dos Estados Unidos da América, e de seguida fecharam agências, estações de serviço e balcões.
Este Governo foi um desastre completo. De público, para a comunidade que governa, escasseou visão, empenho, propostas, inovação, medidas que modernizassem o tecido económico e social. A venda de empresas públicas tornou-se um exemplo gritante de como não se deve governar.